Sou do tempo em que tecnologia de ponta começou a surgir no país como um luxo da finada classe média. Primeiro vieram os bípes, telefone celular era um tijolo que só alguns ricos podiam se da ao luxo e os computadores domésticos estavam longe de ser parte dos modelos de eletrodomésticos usados pelas famílias do Brasil. Hoje em dia você vê pessoas de todas as classes com todos os modelos de celulares, mp3 e etc.
Quando eu era adolescente idolatrávamos bandas e rodas de violão. DJ era como um técnico de mesa de som especializado em música, mas jamais “artista”.
O primeiro club que eu fui era o “Mingau”, matinê dançante que acontecia no Ipanema club de Sorocaba das 18h00 as 22h00, um ou dois domingos por mês. Vendia Keep Cooler (bebida alcoólica) para crianças de nove a dezesseis anos e sempre terminava tocando “teikemaibrendouê....”, tema do filme Top Gun. Sempre!
Da minha parte e da parte de muitos dos amigos que estavam comigo testemunhando o nascer desta “cena eletrônica”, era de dar orgulho e alegria ver e sentir aquilo que a nossa geração estava criando.
Queriamos ser livres da esperança do “grande amanhã” e “quem sabe faz á hora” e todo aquele passado sentimental energético que herdamos, mas que já vinha acontecendo desde antes de termos nascidos.
Foi essa a visão que tivemos, eu e talvez muitos sensíveis naquelas primeiras festas, quando tudo era novidade.
Pensar hoje na influência da tecnologia em nossas vidas me faz lembrar meu professor Wilson Ferreira, autor do livro: “O Caos Semi-Ótico”, que dizia que: Toda tecnologia nasce de finalidades bélicas antes de se tornar doméstica.
Alguns anos depois eu fui pra Bahia e encontrei a visão que eu temia. Aquele sonho de liberdade cultural através do cruzamento da natureza com a tecnologia pacífica em música e arte que criávamos, tinha se transformado numa horda de escravos coloridos tomadores de cápsulas e adoradores de técnicos de mesa de som especializados em música, ops, quer dizer DJ.
Em meio a uma praia suja, cheia de garrafas plásticas, restos de alimentos e embalagens pela areia, barracas de camping, gente de todo tipo tentando imprimir uma liberdade psicodélica sem nenhuma disciplina, sem nenhuma consciência sobre o que é respeito. Uma porção de jovens agindo como adolescentes e uma porção de adolescentes querendo agir como jovens. Pessoas de treze, dezoito anos sem orientação, sem propósito, sem educação. Tinham apenas drogas, dinheiro e uma vontade suicida de dançar sem nunca parar. Três, quatro dias seguidos, sem sono, sem banho, sem comida, sem higiene, apenas nutridos pelas impressões, pelas substâncias estupefacientes e por segredos guardados dentro de corpos, caras e bocas que desfilavam para a multidão.
Vale lembrar que as festas e after hours das 06h00 as 18h00 estão proibidas aqui na ilha e isso aconteceu porque estavam perdendo o controle. Pessoas morriam de overdose nas pistas de dança, o corpo era coberto e a galera continuava dançando. Não me lembro de estar em uma festa e alguém ter morrido nela, mas quando eu freqüentava festas, sinto que se isso tivesse acontecido, a festa teria acabado.
Eu sei que há muita coisa boa nas festas, que são necessárias para reunir gente divertir as pessoas e que há muita gente boa e bem intencionada produzindo festas, fazendo isso com amor e com uma vontade sincera de proporcionar um entretenimento a preços justos e saudáveis.
Porém, festa significa ter algo para celebrar e para aqueles que se consideram cidadãos do mundo e não estão limitados a uma região geográfica do globo, sabemos que: "Há muito trabalho para se realizar nesse planeta e quase nada para se comemorar".
A indústria de festa virou o atraso da juventude e o boicote do amor, do sagrado e do eterno. Enquanto meia dúzia de empresários, umas dezenas de dj´s, traficantes e mais alguns promotores enriquecem da noite pro dia, a juventude européia ( que serve de espelho para a juventude mundial) empobrece, vai a banca rota se reunindo todas as noites em pequenas caixas negras fechadas para: Respirar fumaça e suor, ficar surdo pra ouvir, sem voz para falar, fedendo, suado, sufocado, pagando preços absurdos por produtos que valem até mil por cento menos do valor que cobram nesses lugares (uma cerveja custa 10, 12 euros em qualquer discoteca e no mercado alguns cêntimos, uma água 7 euros e pode ser comprada por 0.6 centavos). E o pior é que essas pessoas se sentem inteligentíssimas fazendo isso e crêem que o resto do mundo todo as inveja e gostaria de estar fazendo o mesmo.
Eu não sei se essas reflexões e informações importam para as pessoas ao redor do mundo e se isso faz diferença para elas. A minha conclusão final é:
"Passei a minha adolescência e juventude desejando ser e estar com pessoas e fazer coisas, idolatrando formas de ser e opiniões que hoje me vejo integralmente em contato. E a ótica de quem está de dentro do olho do nevoeiro do furacão sem dúvida é outra; mais cru, menos glamourosa, simples e objetiva".
Eu não admiro mais essas pessoas. Estava enganado a respeito da felicidade, propostas e alegria delas. Percebi que A grande maioria das pessoas que deixa suas casas e sai pela noite buscando diversão em discotecas e bares está em fuga de si mesmo e da realidade que criou pra si. E tenta através da reprodução de ciclos de humor positivos e negativos e de uma padronização massiva dos gostos, dos ritmos e das impressões se sentir integrado, menos só e menos responsável pelos fracassos e pela preguiça e sempre se espelhando e se comparando com gente que está mais podre, mais embaixo, mais “acabadinha”.
Da mesma maneira que durante o dia seu corpo se energiza e está desperto elivre para realizar as atividades que você busca e realiza, a noite é o dia do Espírito.
À noite, foi feita para que o corpo físico material grosseiro relaxe; e o corpo sutil se torne lúcido, esteja um pouco livre do cárcere em que se encontra durante o dia. E assim possa habitar e visitar as diferentes dimensões a que tem acesso.
É maravilhoso pensar que: O Espírito numa atitude de doação se eclipsa durante o dia, para que o corpo material grosseiro habite o reino material de Satwas e rajas (manhã e tarde). Em troca disso, o corpo sutil tem a suas horas de liberdade a noite, (em Tamas) permitindo assim que o corpo material grosseiro adormeça se re-energize e mais que tudo, se proteja das influências energéticas densas e confusas que fazem parte das trevas e do reino energético de Tamas. Tudo assim, simples e clássico como a vida pode, deve(?) ser.
R.M. - Medico Animosico - Outubro de 2009
Eu lembro que perdi muita energia em noites, tentando ser oque eu não era, para parecer engajado, inteligente e moderno. Hoje eu vejo como a vida diurna é uma maravilha e a noite é uma dádiva da reflexão e do encontro com si próprio.
ResponderExcluir