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quarta-feira, 20 de outubro de 2010

A Carta que Eu Escrevi ao Meu Pai.


 “Pai”,
Eu estou te escrevendo esse texto hoje primeiramente para me desculpar pelo tratamento grosseiro que eu lhe dei no inicio do ano quando depois de 16 anos quase sem noticias você por ventura (e para defender seus interesses) apareceu na vida da minha irmã Ana Paula e de todos os meus irmãos através da troca de email bizarras que houve entre você, nós e sua segunda mulher, nossa Amiga e mãe de minha irmã, a Sônia.
Acho que eu Não preciso explicar a você o fel e a raiva acumulados em mais de uma década por essa postura “poncio-pilateânia”( e a nível contemporâneo por que não dizer, “psdbista-republicano-social-democrata) Que você elegeu e se permitiu adotar ao longo da sua biografia terrestre.
No Inicio de 2010 Eu estava vivenciando uma fase de dois anos de extremos sucessos e êxitos em diversos setores de minha vida e talvez estivesse um pouco deslumbrado e tenha faltado com o respeito e me permitido ser arrogante e grosseiro com você. Conto com o seu perdão. Por favor me desculpe.
Eu não espero que seja essa a lembrança que você guarde de mim. Por que o seu mau-caratismo e frieza em verdade, não é a lembrança que eu guardo de você. Eu tenho várias lembranças legais de nós dois em diferentes momentos dos dezesseis anos de contatos, muitas vezes intensos que tivemos. Eu me lembro desses momentos muitas vezes, quase todos os dias e apesar de não ser uma pessoa nostálgica ou com saudosismo do passado, eu uso essas lembranças como combustível para não deixar acontecer comigo o que eu vejo acontecer com 95% das pessoas deste planeta. E Eu estou falando sobre Ser feliz.
Eu me lembro que tinha um certo trabalho, mas acabava conseguindo fazer você me levar andar de mini-buggy e mini-moto, cavalo, bicicleta no parque. Passeios no shopping. Pizzarias. Lembro do restaurante chinês chamado “Golden Dragon” que ficava na avenida Rebouças. Lembro de outro chamado “Inverno e Verão” onde uma vez comemos Foundie e vimos o show do grupo algodão doce. Lembro que íamos na loja de mágicas do shopping Morumbi. Nas exposições de aves e peixes (que davam pintinhos de brinde), no Alice Park Center, Na cidade da criança em São Bernardo, No Playcenter.  Lembro do corcel vermelho, do marron, da Belina e do Passat. Lembro que você jamais conseguia disfarçar sua libído com qualquer ser, que se parecesse feminino que passasse. 
Lembro o dia que você entrou em casa chegando do trabalho tarde da noite com um vídeo-cassete g9 panassonic debaixo do braço. Lembro de uma capanga de couro cor de abóbora. Lembro das garruchas de meu avô Eduardo. Dos Retratos que ficavam encima das paredes dos escritórios. Lembro de minha avó Teresa e o beijo longo que você deu no rosto frio dela no dia do velório antes de fechar o caixão. Lembro da fase difícil que foi o nascimento do Pedro e quantas inúmeras vezes eu aos 5 anos escutei o nome “Evaldo Foz”, “Edel”, “UTI”, “Prematuro”, "Casa Nova". De Quantas Vezes ouvi e contei a piada do "colete preto", "puta Merda Errei!", "Um côco, dois litros de leite e um bombril" e ouvi você dizer “Babauêi” e cantar "Ronda (“de noite eu rondo a cidade a te procurar sem te encontraaaar”) e aquela sua idéia absurda de que estava fazendo a “moldura” da música enquanto ficava “Babauetizando” tudo pra tentar disfarçar que não sabia a letra.
Lembro das mochilas da ACM, do cheiro de cloro e de pisar na água da porta que dava caminho para o vestiário, das suas piadas sem graças que você inventava de ultima hora. Lembro de você me explicando como funcionava a embreagem e o câmbio. Lembro de você puto por que o carro morria quando você estava tentando ensinar a gente dirigir. Esse tema de dirigir tenho certeza que é marcante não somente para mim, mas para o Paulo. Você não se esforçava para ter paciência com nada mesmo né? Eu também sou assim.
Eu me lembro da pose de caubói cafona que você fazia inconformado e dizia: “-o quêêê” e eu e o Paulo imitávamos. Lembro que você (e minha mãe) muitas vezes pareciam duas bichinhas loucas ameaçando nós com uma merda de cinta (e dependendo do grau da travessura, vinha com fivela) Lembro de você gritando com uma nota de 50 nas mãos dizendo: “Eu também quero ficar genial!!”  Quando descobriu que eu e o Paulo tínhamos fumado maconha.
Lembro daquelas fitas k7 com suas transas gravadas. Lembro que eu esperava você ir trabalhar para fuçar seu armário, mexer em suas gavetas , ver o que era camisinhas. Lembro de você muitas vezes levar café da manhã na cama para gente. Lembro que você cozinhava mal, mas era esforçado.  Aqueles rádios e coisas antigas cheias de durex que você guardava, as lapiseiras. Suas manias e paranóias estranhas com chaves, medos, agressividades, instabilidades e inseguranças posso dizer que foram herdadas por mim. 
Lembro do cheiro enjoativo e exagerado do perfume “tarôt” no closet. Lembro do maço de dólares que você escondia embaixo do pufe. Lembro que você era muquirana e pão duro com suaves matizes de fartura competitiva e crises de generosidades bipolares.
Lembro de seus esconderijos para tudo. De sua coleção de playboys e Ele e Ela. De Seu eterno sentimento de vitima e de sua prancha de ler jornal em frente á privada (que você se orgulhava de ter feito com dobradiças na porta do armário embaixo da pia e passava a manhã de domingo lá, lendo o shopping news e o diário oficial enquanto cagava). 
Lembro Dos Seus sapatos, da caixa cor de laranja de engraxate com a qual eu tanto brinquei e do seu pisar torto (meio “dez pras duas”). 
Lembro de suas palhaçadas a La Jerry Lewis. De sua barriga em diferentes fases. Do seu complexo por  ter o corpo cheio de pêlos, inclusive nas costas e nos ombros o que faziam eu e meus amigos dizer que você "Não tirava o pulover para entrar na piscina". Lembro bem De seu narcisismo esquizofrênico, suas megalomanias e medos. De que a primeira vez que eu senti o efeito de um vinho foi com você na mesa branca da copa do Maison royale. Lembro Da sua rasa paciência para passeios em família. Lembro da Sede campestre e de passeios de pedalinho. Do sitio do tio Massaro. O que mais me pira lembrar era “Barra Bonita”. Essa foi uma das maiores enrrolações e álibis que você tinha para conseguir de nós o que queria. Fomos ao fonte Sonia, ao solar das andorinhas, mas a tão sonhada “barra bonita” que tinha os maravilhosos tobogãs aquáticos, você amarelou e virou lenda.
Lembro do Delfim Verde e de quando era bem pequeno ter ido ao seu trabalho. Lembro do tio Visconti. Lembro da Chácara da Tia Cláudia (essa eu tirei do baú mesmo!!!) Do Seu “Terreninho” em são roque. Da feirinha em frente a casa da vovó Teresa, da praça, do vendedor de pipocas coloridas, da caixa econômica e que eu chorava quando tocava a musica: “quero ver você não chorar, não olhar pra trás, não se arrepender do que faaaaaaz”.(E o Paulo quando descobriu isso foi cantando a musica até o rancho da pamonha ou você gritar de repente do nada: - Cheeeeeeeeeeeeeeeeega”.)  
Aliás, no que depender do rancho da pamonha, você já foi um super pai pra mim. A Gratidão que eu sentia por ir patinar no gelo, ir ao Rancho da pamonha e poder aprender a dirigir antes de tirar carta, já seria o bastante para que eu te perdoasse por qualquer “homicídio ou estupro que você viesse fazer a alguém que eu amasse”.
Lembro da minha bicicleta Freestyle que ganhei de natal e de meus amigos com inveja pois era a bike mais bonita de todas. Lembro Da Pista de bici-cross da BMX na marginal. De você puto nos engarrafamentos na serra indo a Mongaguá. Lembro De você discutindo no transito, agredindo e cuspindo em pessoas e mostrando aquela carteira vermelha cheia de durex (ridícula) com uma estrela de xerife patética, se sentindo uma autoridade, mas se comportando como um psico-sócio-pata. 
Lembro De sua barba cerrada que uma vez na praia no seu colo eu e o Paulo cortamos e dos pêlos encravados sangrando em sua gola engomada no fim do dia quando voltava do tribunal.
Lembro de uma caixinha de pomadas. Das gavetinhas do criado mudo e de um colírio de cor azul que ali tinha. Lembro de uma ou outra festa junina na casa do tio Afonso. 
Lembro muito bem da vergonha que você sentia da humildade e simplicidade de seus familiares. Lembro dos passeios em Mairinque e das festas do vinho e da Uva em São Roque. Das histórias que você contava sobre meu avô ter sido dentista e depois ferroviário. Do restaurante que tinha na estrada chamado galipolli e de quantas vezes por dia você repetia que não tinha tido nada do que agente tinha e tinha perdido seu pai com nove anos. Lembro de uma vez o carro deslizar na mancha de óleo e a gente quase ir pro precipício. Lembro que você contava a história da explosão da fábrica, de quando você desligou o farol e entrou no barranco (bixo-burro!!!). Dos passeios no cemitério, do túmulo da minha avó e do barão de Itapetininga.
Lembro de sua sede por classificados de apartamentos. De sua fixação intoxicante por controle remoto, proteger as coisas com durex e guardar dinheiro. De suas tentativas de seduzir a vizinha ou a empregada.  Do seu orgulho de ter comprado um simples jogos de panela ou cozinhar um ovo frito no micro-ondas.
Lembro das ruas: Estela, Oscar Porto, Umberto I, Nicolau de Souza Queiroz, conselheiro Brotero, do telefone 5796952,5726956, nem sei se esses eram os nossos ou o que eu decorava de amigos. Lembro de você bater em minha mãe, daquela gravação da secretária eletrônica com voz de Sarcófago e dicção forçada. Lembro de você se achar o maioral do Estela só por que era procurador e tinha sido promotor de justiça e me lembro da sua festa de quarenta anos no salão de festa do prédio. De Você tratar mal educadamente e de forma impaciente o senhor Constantino. De você obrigar o "Suel", síndico do prédio mandar embora o porteiro de nome roberto, por que eu disse que ele fazia brincadeiras com teores de pedofilia comigo. Lembro do faxineiro do prédio chamado valdomiro, que morreu e do dia da morte de Tancredo Neves e da musica "coração de estudante" do milton nascimento que tocava toda vez que o reporter de sobrenome "brito" entrava no ar para dar noticias sobre o estado de saúde do presidente.
Lembro do Capitão Ronbenso e do coronel Ubirajara (e agora me sinto perplexo pensando que esses homens eram e talvez sejam até hoje, em verdade grandes assassinos, que comandam e controlam mentalmente milhares de outros assassinos que não conectam a verdade de que são assassinos simplesmente por que existe um Estado, uma maquina burocrática que pretende tratá-los como filhos bastarados ou escravos e fantasia eles de farda, cinta e bota, abastece de ração e moedas, chama-os de “policiais” e pendura medalhas no peito deles quando eles matam e através de medo e repetição de mentiras, convencem a eles de que isso é justo, correto, verdadeiro, normal, positivo, necessário, imprescindível). E você como corregedor é o homem que julga ou absolve esses assassinos de farda que tem a missão de reduzir a população global com a desculpa de que estão fazendo a segurança das pessoas contra os: “Mal- Elementos” que povoam a sociedade. Que interessante.
Eu me Lembro de sua mania “Franco-Mussolínica” de toda vez que passava um camburão da Rota dizer: “-Meus Meninosssss”. Com Aquele Sotaque “Carioca do Rio de Mairinque” que sabemos que você jamais perdeu e inclusive parece que investiu pesado na manutenção dele. Lembro de você francamente me instruir a pedir o R-E de qualquer PM otário que me parasse. Lembro de você dizer gritando que se algum de nós tivesse problemas com drogas, que você não ia tirar ninguém da cadeia.
Cara! Eu me Lembro de Muita Coisa! E Já devo estar chegando na 5ª pagina. Eu duvido que você leia tudo, mas se chegou até aqui, parabéns!
Eu queria mesmo te dizer é que eu sinto uma gratidão enorme por você e pela vida terem providenciado a nossa distância por que através dela eu descobrir valores que com a sua presença seria impossível conectar e experienciar. Eu Não me sinto uma pessoa nem melhor nem pior do que você. Eu sei que no fundo, bem no fundo da sua via láctea você é um cara simples, legal e bacana, que de momento elegeu a obscuridade, o medo e a mentira para aprender as coisas que outros, talvez poucos, escolhem aprender e conhecer através da coragem, da Verdade e da clareza da Luz.
Eu não tenho nada contra a sua pessoa e não quero o seu mau. Independente de suas patifarias e escolhas, você é meu pai. Um Pai covarde infantil de Merda, mas é meu pai e isso basta para que eu te Ame e dentro do que me for possível, admire você.

Que Você encontre Muito Amor, Felicidade e mais que tudo, Paz. 
Que você consiga Viver Sem Mentir Pra Você Mesmo, Mesmo que não consiga deixar de mentir para as pessoas.
Que a Verdade Ilumine Seus Caminhos, Horas e Dias Esteja você onde estiver e aonde Quer que Você Vá.
Boa Sorte.
Namastê.
Ruy.

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